quinta-feira, dezembro 13, 2012

Perdi todos os laços, vês ?


Perdi todos os laços, vês ? tudo o que me ligava aos outros, e que nunca me ligou a mim. Nos ouvidos trago sempre sons do que não criei. Nos pelos que arranco do corpo trago imagens do inimaginável que me ocorre por dentro da retina, nos sonhos dos sonhos impossíveis e da negação do ser. O futuro. Os sonhos. O que nunca vai acontecer. A realidade passa-me as mãos, não de uma forma suave, como areias, mas como pequenas agulhas que me fazem jorrar sangue e me deformam os nervos e a carne e o odor e o sexo, e o odor a sexo, e o sexo que não existe. E a única fertilidade em mim é ruim, talvez de nome, por ser graça de fácil execução, ou por abanão dos órgãos másculos que de homem nunca terei nada a não ser um nome, e tudo tem um nome, e se tudo tem tudo tudo é tão banal. Como a vida e o mundo têm tudo e se tornam banais e o tédio te sobe e desce como uma necessidade fisiológica incontrolável. Desabotoarei todas as camisas, se para tantas mangas terei braços ensanguentados e mãos atrozes, cheias de agulhas. Dor física. Escorre-me sangue na ponta dos cotovelos até ao chão, hei-de falecer assim, lentamente, com os ouvidos cheios do que nunca criei.
Adoro a paixão e a não-paixão, ao ponto de sentir um extremo e não saber qual é. Não me conheço e não parto o pescoço, porque visto camisas novas todos os dias. Fora. Tecidos. Coisas que escolho, para me mostrar ou esconder, não sei. Mas sei quem sou mesmo não sabendo, porque não sabendo sei que tenho essa noção.

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